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Cazuza (1958-1990)
Uma das poucas cartas psicografadas em que realmente se vê que são
verdadeiras é a do cantor Cazuza, que morreu aos 32 anos por
complicações do vírus HIV. Ela veio a público no ano de 1996, e dá pra
acreditar que é do cantor de fato por dois motivos: assim como a de
Clara Nunes, esta também foi psicografada por Chico Xavier, um ser
humano e tanto; e as palavras não são nada difíceis. Assim como ele é no
plano superior, com certeza ele deveria ser assim na Terra, como
mostravam as músicas compostas por ele. Lembrando que o espírito que
escreveu a carta não se identificou, mas obviamente essa carta é a dele,
como mostram os trechos a seguir:
“Pensava que após ressacas eu era sempre perdoado por todos os anjos
do amor. Tinha sempre uma noção de ser feliz, aqui esta felicidade é
muito mais explorável. Eu já sentia algum ar novo e certas paisagens
dela, nada volta ao seu estado natural como eu pensava apenas não sou
muito como disseram num certo livro sobre minha insignificante pessoa
idealizada. Inventarão o meu show. Não sei como te oferecer certezas
disso, nós ainda vemos tudo daqui.
Estou numa sociedade socialista democrática perfeita. Eu nunca quis
saber destas coisas de eternidade, porque para mim era coisa de papa.
Então arduamente e com certa teimosia eu procurei algum outro mais
legal, foi difícil, pedi que encerrasse o livro anterior e não
divulgasse nada ainda por ordens superiores, e achei um que já foi muito
pirado na vida desde a infância, uma piração mais controlada, claro,
mas que tivesse mais a ver com minhas intenções de volúpia de escola em
palcos de doutor. Todos já deviam saber que eu não pertenceria a
federações,
editoras ou onde existir lucros financeiros em meu nome,
excluam-me disto; onde tiver isso com certeza não será eu.
Não quero ser o mesmo babaca e nunca irei mais fazer parte disso,
baby! Essa é minha vida atual, sempre foi e realmente não podemos
enganar o que vem da natureza. Aqui não tem jogo político. Não adianta
inventar que sempre fui o garotinho exemplar da mamãe depois de aloprar
no pó durante minha vida quase toda. Mas, graças que eu achei um que
parecia me aceitar, foi realmente difícil achar algum que tivesse a ver,
mas quer mesmo saber? Dane-se sobre isto! Eu os apoio e ele entende é
muito bem da minha música, entende muito bem sobre o mesmo amor que
conhecemos nos tempos dos palcos. Eu atacava quem estava manso e agora
entendo que pretendo consertar algumas coisas dentro de mim, deixar de
ser tão bêbado em certos momentos, estarrado, moleque, preciso controlar
mais os meus palavrões.
Aqui temos escolha de sermos mais sérios, e eu escolhi ser um pouco
mais sério mesmo, responsável. Tudo começou alguns segundos antes da
minha morte, apesar de debilitado, eu me sentia muito vivo apesar de me
encontrar sem forças. Eu me sentia apagando como luzes do palco quando
não se tinham mais plateias, acabou, amanheceu! Vamos embora! Eu ainda
insistindo com os meus cigarros nas mãos olhando cores cinzas para onde
quer que os meus olhos olhassem. De repente, o meu corpo franzino de
alguma forma sabia que naquele dia estava mesmo para morrer e que de
alguma forma sabemos quando acontecerá, é bastante assustador. Eu só
aguardava tudo escurecer para depois poder esquecer de mim. Eu estava
ansioso com o corpo dolorido. Eu já havia atravessado e nem sabia. Eu já
havia lido que não doeria e isso me ajudou bastante a suportar. De fato
eu já procurava pelo momento mais esperado da vida, mas será que já
havia acontecido isso por muito tempo e eu não sabia? Impressionante,
não senti passagens, mas minha visão não foi interrompida em nenhum
segundo. Todo o ritmo tinha o seu fim, doses mais fortes pareciam que
não. Era assim que eu me sentia. Percebi que o universo era bem maior do
que tudo que eu já havia conhecido com várias atmosferas umas sobre
outras. Não sei te explicar, de alguma forma sabemos o momento exato
quando deixamos o físico, não sei como foi feita essa separação não
flagrei esse momento como eu flagrava doidão, mas bem atento sobre
curvas de quem adormecia comigo num motel barato de Copacabana;
realmente não senti isso acontecer. E o fato de saber que minha visão
não cessou tornou-se muito maior do que saber de fato sobre polêmicas do
fim,
mas depois que atravessei percebi que esta questão era a mais
pueril de todas, é pífia e é babaca, ao mesmo tempo para mim foi do
caral… Saber que eu ainda me mexia. Mas alguma dúvida ainda pairava toda
minha mente. Realmente havia partido? Era estranho ou um sonho? Pois
minha moleza era muito forte e tonturas me levavam ao delírio constante.
Eu tinha fortes disenterias, dores de barriga, forte abstinência. É
inevitável viver o nosso drama, conhecer-nos detalhe a detalhe. Foi mais
do que dizer coisas insanas no ouvido de um padre no tempo de escola.
No mundo realmente eu me envolvi com tudo que fizesse parte da música,
rock e poesia (mas eu era bom de letras), mas sabia que não havia
nascido para o drama.
Fizeram-me até o garotinho do samba. Aproveitei tudo para aloprar,
“cheiração” e muita putaria. Com os mais luxuosos segredos. Que bom para
mim amor. Ledo engano. E daí se eu estava com HIV? Não vou dizer que
não me arrependi, pois me arrependi mesmo. Foi muito triste essa fase da
minha vida. Ninguém gosta. Foi no que mais sofri , foi quando soube da
notícia, quando eu pensei na conseqüência, quando eu pensei em todo o
meu passado e na minha mais inocente felicidade de embriaguez, quando
pensei nos meus sorrisos ingênuos. Se eu pudesse fazer diferente eu
teria feito e não teria pego essa porra, teria me cuidado muito mais e
teria morrido pelo menos chique como uma dama velha ao som da vida em
bandos e com uma bela garrafa de vodka ao meu lado. Esses eram os
pensamentos juntos aos desgostos que ao mesmo tempo eu sentia quando
ainda deitado antes de partir febrilmente. Mas isso não feriu
completamente o meu ótimo senso de humor. Não fui recebido por ninguém.
Seria extremamente infantil que religiões fossem resolver transcendentes
questões deste infinito.
Agora que me fiz curioso sendo assim, quantas existências será que eu
tive? Quantos atos de barbaridades será que cometi? Quantos séculos de
conhecimento será que eu tenho? De serviços? De triunfos? Quantos sopros
renovadores será que eu suportei? No fundo é muito difícil entender
dentro do nosso íntimo sabermos que continuamos. Você pode até estudar
toda teoria, ser “expert” no assunto, nada é mais forte do que você
viver essa situação. Senti falta foi da minha multidão, das baratas dos
palcos apertados, da minha sintonia com o público, do calor humano, dos
meus pais, da loura que me deu em segredo um par de rosas no almoço, dos
amigos queridos da infância do amor e ódio. Eu queria mesmo era poder
ficar pasmo e maravilhado com tudo que estava acontecendo comigo. Foi
assim que eu percebi que eu não tinha nada de astro, tudo fazia parte da
alegria somente para vaidades. E essa realidade onde estou é muito
diferente.
Permaneço por aqui como um mero espectador na última cadeira do
teatro divino. Estou bem, estou bem, estudando bastante (finalmente
peguei gosto por algum estudo) e indo para recomendadas palestras
continuamente, hoje é o que importa. Nestas palestras sinto-me 2.
tomando o mesmo soro. Existe muito mais que eu poderia dizer, mas
através de outros já foi e será melhor dito, não é minha tarefa. Mas
garanto não foi nada fácil o meu inferno astral após o desencarne. Hoje
só estou aqui para somar e ajudar na sua fé. E eu pensei que ser novo
era viver sempre numa fria. Nessa idade só queremos uma transa boa. O
olhar eu traduzia ser o passaporte para o sexo casual. O sorriso a
confirmação indébita dentro da dose do meu despretensioso Whisky de
Leblon. Eu simplesmente fazia de tudo, até fingia ser príncipe, na
verdade eu estava mais para ser, se continuasse por aí, mais algum
incansável bobo da corte. ‘Dias sim, dias não.’ Ou ‘Segredos de
liquidificador.’ Ou ‘Partidos’. Ou ‘Burguesia’. Não importa mais.
Desculpe pelas minhas interpretações doidas e pelos meus estresses
nervosos.
Desculpe de paixão a todos. Eu não venceria minha provação por isso
de repente fui retirado abruptamente da vida, mas também amenizei muito
mais dores da punição e sou muito grato por tudo que eu fiz. Que Deus os
proteja hoje e sempre minha querida até então última humanidade, pais,
todos os meus fãs e amigos. Só queria que soubessem que agora
encontro-me mais completo, feliz, aprendendo novas boemias, o de sempre,
reaprendendo, cantando novas músicas, nada de drogas, nada de egos.
Beijos!”
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